Acabei de descobrir, por acaso e ventura, que hoje está completando 405 anos da primeira publicação de Dom Quixote de la Mancha. Segundo o Oráculo do XXI, o wikipédia:
"Dom Quixote de La Mancha (Don Quijote de la Mancha em castelhano) é um livro escrito pelo escritor espanhol Miguel de Cervantes y Saavedra (1547-1616). O título e ortografia originais eram El ingenioso hidalgo Don Qvixote de La Mancha, com sua primeira edição publicada em Madrid no ano de 1605. É composto por 126 capítulos, divididos em duas partes: a primeira surgida em 1605 e a outra em 1615."
Não sei se a data 16 de janeiro é precisa. Já os anos 1605 e 1615, são. Mas isso é desimportante, aqui. Vejam o facsímile da primeira edição, que beleza:
Nos últimos dias tenho cogitado não ler absolutamente mais nada de "novo", por um bom tempo. Apenas reler tudo que já li até hoje. Quer dizer, "tudo", não. Mas, tudo aquilo que me foi significativo. E Dom Quixote está em primeiro lugar na minha lista. Não sei se serei bem-sucedido nessa empreitada, porque é a típica promessa que não se cumpre. Mas vou tentar, nem que seja em vão.
Com esse pensamento em riste, comecei a reler Dom Quixote. Nunca cogitei que a experiência de reler essa obra fosse ser tão boa. Dentro daquela linguagem travosa, difícil, pra poucos, nesse objeto de 609 páginas amarelecidas pelo tempo, de pequenas letras negras de serifas, tenho observado que esse livro é mais-
mais (me falta um adjetivo) do que eu imaginei quando li a primeira vez, há 8 anos.
Antes de começar a releitura, abri uma página ao acaso. Cai na página 351, capítulo XI, da minha edição da Abril Cultural, intitulado "DA ESTRANHA AVENTURA QUE SUCEDEU AO VALOROSO DOM QUIXOTE COM O CARRO OU CARRETA DAS CORTES DA MORTE".
Logo no início, Sancho Pança mostra toda a sua espirituosidade. E Cervantes dá prova de que sua obra é merecedora do título de Literatura Universal.
"Extremamente pensativo, ia Dom Quixote seguindo o seu caminho e considerando na burla que lhe tinham pregado os nigromantes, com o transformarem a sua Senhora Dulcinéia na desastrada figura duma aldeã, e não imaginava que remédio se podia empregar para que voltasse ao seu primeiro ser; e estes pensamentos punham-no tão fora de si, que, sem dar por isso, soltou as rédeas a Rocinante, o qual, sentindo a liberdade que lhe concediam, a cada passo se detinha para pastar a verde relva que por aqueles campos abundava. Tirou-o Sancho Pança da sua distração, dizendo-lhe:
- Senhor, as tristezas não se fizeram para os brutos, e sim para os homens; mas se os homens sentem demasiadamente, embrutecem;"
Não sei se reler será melhor do que ler, porque a descoberta desse livro me criou um modo diverso de perceber as coisas todas do mundo, e foi uma leitura muito transformadora para mim.
Não apenas nos conteúdos, mas nas formas, mesmo, que é um livro de linguagem difícil, de colocações pronominais estranhas e de léxico não muito simples - esses elementos demandam um bom dicionário sempre ao lado, e leveza de leitura para não travar nas formas pouco usuais dos pronomes.
Certamente será uma experiência marcante, e os entendimentos podem ser mais profundos agora, tanto das formas quanto dos conteúdos - e vice-versa, que forma em si também é conteúdo.
Bem, se eu viver, verei.