02/07/2009

A Hora dos Palhaços

Tudo corria bem na pelada daquele domingão, e o time de vermelho ganhava do time de preto. O juiz, de branco, acabara de validar um gol duvidoso do time de vermelho. Mas ninguém discutia mais. O gol valeu e fim de conversa, dissera o juiz, imponente, de branco.

Quando o time de preto se preparava pra bater o meio de campo, uma multidão de palhaços começara a invadir o lugar do jogo. Misturaram-se aos jogadores, e o campo transformou-se numa turva multidão colorida.

Logo após a invasão de palhaços, viu-se chegar outra multidão de palhaços, mais coloridos ainda, trazendo consigo pedaços de engrenagens e estruturas desmontáveis, retiradas de grandes caminhões estacionados nos arrabaldes dali.

Os jogadores do time preto e do time vermelho já não se distinguiam do juiz de branco. Mesclaram-se de tal forma entre os palhaços que pouco se poderia diferenciar.

As engrenagens e estruturas foram rapidamente montadas. Enquanto isso, os jogadores do time vermelho e do time preto ficaram imóveis, assim como o juiz de branco, no meio daquela multidão de palhaços - apenas conseguiam mover um dos braços para coçar o nariz de quando em vez.

Apesar de olharem para o espetáculo, jogadores e juiz nada viam por baixo da grande lona azul que se estendia altiva aos soalhos de seus olhos.

Passados alguns dias, as estruturas foram desmontadas e os palhaços que entupiam o campo foram ordenadamente se retirando. Um a um, formaram uma disciplinada e grande fila indiana.

A forma de retirada causou forte impressão nos jogadores do time vermelho e do time preto, assim como no juiz de branco. Que se entreolharam - não sem certo assombro.

Melancólicos por alguns instantes, os dois times e o juiz pararam de especular sobre os motivos de o circo ter partido assim, tão de repente. O juiz deu por encerrado o jogo, pois não lembrava se o gol que havia validado era do time preto ou do time vermelho. Àquela altura do campeonato, isso pouco importava.

A bola - a mais resignada das esferas - já não tinha dono e foi largada no campo, onde repousou tranquilamente por longos dias, à revelia das voltas da esfera terrestre.

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* Telas da pintora paquistanesa Asma Ahmed Shikoh.

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