28/05/2008

O Carrossel e o Cadilaque

E se o que deu início foi o disparate?

Um carrossel alucinado em plena pista
Insurgiu-se iluminado contra um carro!
E o jogou do outro lado da
Avenida Conde da Boa Vista.

Era um Cadilaque-Dinossauro!

– Mas, logo um cadilaque?
– Pois sim: O Cadilaque!
E, veja bem, era o carro do...
“– Ei, Vou certo Carro!”
– Disse o Carrossel para o Cadilaque, no momento do
Disparate-trombada-alucinada-e-absurda.

Está aí
O disparate
Do caso
Dito!
?
:
:

Uma gota de incerteza pinga qual lágrima-insídia
Que produz ondas de freqüências impossíveis e inescrutáveis...

Interferência.
Dano.
.

Com mãos de Fídias (o Grego), Certeza foi quem
Esculpiu a sua obra divina
Em tempos-dinossáuricos,
Quando Música se deixara
De imaterializar Crenças
Nos séqüitos de Dioníso!

Apolo murchou o instinto da vida.
Há que se retornar à vida!
Dançar com a vida!
Ter com ela.
Tentá-la.
Sê-la.
Tê-la.
Sêla-la.
Ser com ela.
Su-rrealizar na ida!
Soerguê-la acaso caída!
Que o ocaso seja o álibi de toda vida.


11/05/2008

Escrita atemporal

"(...) Surgiu e morreu como um clássico no que se refere ao formal. Quanto ao conteúdo, recordo que meu amigo, o poeta, me disse uma vez que no final das contas, Kafka não havia feito outra coisa a não ser renovar o paradoxo de Zenão de Eléia:

uma flecha não pode chegar a sua meta porque antes tem que passar por um ponto intermediário, antes por outro ponto intermediário, e assim sucessivamente temos um número infinito de pontos onde a flecha em cada momento está imóvel no ar, e somando imobilidades não se chega nunca ao movimento.

(...)"



Jorge Luis Borges - Sobre Kafka ("Escrita Atemporal")

P.S.: O artigo na íntegra eu vou colar aí na seção de comentários, pra quem quiser ler.

Efeito de dias melancólicos

O que se faz com tanta falta?
Coisa insólita e abstrata
Que corrói e aniquila:
A tal da carência ingrata!

Falta tanto que já não falta
Há sobra de tanta falta.

Sobram notas em uma harmonia que falta.
Ah! Se pudera ainda possuir minha flauta!
Mágica flauta que me falta!

Mas, falta tudo:
Falta flauta, falta harmonia.
Sobram sombras
Na minha eterna falta de companhia!

Abandonar-me-ei, que não
Há correntes em meus pés
Mas não estou livre!

Meu coração é arrastado
Por um albatroz velhaco
Que, aos cacos corrói,
Corrompe e destrói.

Oh! Alma bela que se enfeia!
Quem se enleia em tua teia,
Tateia no escuro e vagueia
Procurando um beijo!

Assim segue a coisa que não anda:
Por caminhos tristes desanda.

Calma, que o silêncio assombra!
Diz-me eu que não me ouço,
Pois que poço de alvoroço
Me enlaço em teu silêncio.

É atroz teu silêncio
Como é assaz quebrada
A asa do albatroz
Feroz que dorme em nós.

Em nós desfaço-me
Em laços torpes.
Crua, a faca em cortes
Retalha-me enquanto asso-me
Para devorar-me
Em plena madrugada...

Plena de silêncio e
De falta de tudo que sobra
E volta, e volta, e volta...