"Nasci em um tempo em que a maioria dos jovens haviam perdido a crença em Deus, pela mesma razão que os seus maiores a haviam tido - sem saber porquê.
E então, porque o espírito humano tende naturalmente para criticar porque sente, e não porque pensa, a maioria desses jovens escolheu a Humanidade para sucedâneo de Deus.
Pertenço, porém, àquela espécie de homens que estão sempre na margem daquilo a que pertencem, nem vêem só a multidão de que são, senão também os grandes espaços que há ao lado.
Por isso nem abandonei Deus tão amplamente como eles, nem aceitei nunca a Humanidade.
Considerei que Deus, sendo improvável, poderia ser, podendo pois dever ser adorado; mas que a Humanidade, sendo uma mera ideia biológica, e não- significando mais que a espécie animal humana, não era mais digna de adoração do que qualquer outra espécie animal.
Este culto da Humanidade, com seus ritos de Liberdade e Igualdade, pareceu-me sempre uma revivescência dos cultos antigos, em que animais eram como deuses, ou os deuses tinham cabeças de animais."
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* Pedaço de Fernando Pessoa. In: "Livro do Desassossego".
6 comentários:
adorei,sério.
"Por isso nem abandonei Deus tão amplamente como eles, nem aceitei nunca a Humanidade.
Considerei que Deus, sendo improvável, poderia ser"
exatamente por aí.
Será que ele já havia lido Mann em `A montanha mágica´?
Desculpa invadir seu blog, mas não me contive... Bom espaço. Parabéns.
Fica à vontade Jurandy.
Tem bastante coisa aí pelos arquivos.
Estou dando uma olhada no teu blog tb.
Abraço!
Massa, tbm gostei do texto.Faço parte de um geração que perdeu a fé em Deus, mas eu, por Graça, não foi atingido, por isso.
HAhaHAhaHAha, seu blog esta muito massa, parabéns.
Reconhecível pela poética nobre, pelos pensamentos fortes e pela genialidade intrínseca. Ótimo!
De cara!!! E, aqui, tu sabes como me dói concordar íntima e radicalmente com essas linhas e angústias...
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